ABISMO
A depressão é como ser atingido por um camião
Até não ser mais possível mover
Ou sequer respirar.
São as notas de silêncio que tanto desejas
Como pérolas num oceano de caos.
É a incerteza do que fazer,
De decidir que a corrente te arraste
Ou continuar a nadar
Ainda que o corpo grite de cansaço.
É olhar ao redor e vislumbrar uma camada espessa de neblina
E reparar que ninguém é afetado por ela,
É perceber que apenas tu és prisioneiro dela
E que te agarra e amarra
Sem te deixar dar um passo em frente,
Puxando-te para o abismo.
É tentar lutar para não sucumbir,
Mas deixar-te ir por exaustão.
Depressão é olhar e apenas ver escuridão
E por vezes ver pequenos pirilampos,
Até perceber que é o sol a querer espreitar pelas fendas do teu caixão,
O qual tem sido a tua casa desde que há memória,
Ainda que apenas agora comeces a assimilar isso.
Depressão é como um boomerang,
Vai embora e volta,
Vai embora e volta sempre.
Depressão é repetir para ti mesmo
“eu quero viver” vezes sem conta,
Esperando que acredites na milésima vez.
É ver notícias de suicídios e querer ter pena,
Mas apenas sentir inveja por não ter sucedido em todas as vezes que tentei.
Talvez o quisessem mais que eu.
Depressão é olhar para o rosto da tua mãe,
A mulher que te deu a vida
E querer dizer que já não a queres mais.
Depressão é aprender a viver todos os dias,
Todas as horas,
Todos os segundos,
Esperando sobreviver ao dia
Ainda que a tua cabeça te diga que lá em baixo é mais acolhedor.
É querer estar bem,
Mas não saberes quem és sem ela,
Como se ela fosse uma velha amiga.
Sempre presente.
Depressão é vazio,
Como se estivesses cheio de sede no meio de um oceano,
Sem a possibilidade de beberes.
É sentires a tua alma despedaçada
A gritar de desespero e agonia
Mas saberes que há quem o tenha pior,
Ainda que não devas desvalorizar a tua dor.
“Sê forte e vais ser feliz” dizem eles,
Como se estivesse encarcerada na minha jaula
Enquanto me tiram fotos,
Como se de uma aberração me tratasse.
É irónico,
Querer a morte
Mas ainda assim lutar tanto por um vislumbre de felicidade.
Não estás sozinho nos pedaços vastos de escuridão que te engolem,
Ainda há esperança de que o sol invada o teu caixão
E que te encha de luz.
A depressão pode ser dona da tua mente,
Mas não tem força para se apoderar da tua alma.
Depressão…
Ela não é eterna.
CATIVA
Diz-me,
Porque castigas o teu corpo
Quando ele é a única coisa que te mantém viva.
Será por saberes isso,
Que enquanto ele te perdurar
Tu estarás como prisioneira numa masmorra de carne,
A qual vive e respira
Ainda que tentes destruir as suas barreiras
Pedaço a pedaço.
Diz-me,
Porque desesperas quando acordas de manhã,
Ao perceber que continuas cativa
Sem teres permissão para voar para longe,
Ainda que das tuas asas sobre apenas o esqueleto,
Como se os teus gritos de agonia
Te tivessem deixado como uma carcaça
À espera dos abutres.
Diz-me,
Porque continuas a tentar
Quando as estrelas já não cintilam,
Quando o teu olhar que era fogo se apagou.
Olha para ti,
Será que vale a pena continuar
Sabendo que estás aqui
Como se te tratasses de um fóssil esquecido,
Enterrado sob toneladas de desassossego.
Continuas a respirar entre miragens de felicidade,
Esperando que a chama se reacenda.
Quem sabe,
Se calhar alguém será capaz de ser a ignição
Da fé que continua sepultada em ti,
Nesse teu cemitério em que perdura a sensação de vazio
E talvez também de esperança.
Ana Cortesão, estudante do 4º ano da ESEnfC
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